A aquarela
de cores que se infundiam no céu despertavam uma sensação de interesse e paz. Sentei-me
naquela grama verde e resolvi ver aquela cena, o vento por entre as árvores
beijavam minha face delicadamente, fechei meus olhos e de repente aquelas
imagens borradas surgiram sem pedir permissão, como de costume nos últimos dias.
O
mundo tinha se tornado diferente, como se meus olhos tivesse aberto, os
detalhes não passavam despercebidos como outrora, uma vida tão corrida, presa
aos afazeres diários o qual prendiam minha atenção e faziam escapar aquilo que
realmente importava.
A
manhã do dia 28 de Outubro de 2010 foi a data escolhida por Deus para mudar
minha vida, a ideia de estar nos planos divinos deixava-me mais tranqüilo do
que achar que Ele tinha virado as costas para mim. Ali estava eu na cadeira,
ela segurava minha mão tão forte, aquelas mãos pequenas e alvíssimas,
lembrava-me o meu tempo de menino ao qual era tudo tão límpido e fácil.
A
boca do doutor mexia de forma lenta e cautelosa, as palavras iam se juntando na
minha mente enquanto meu corpo e espírito tentavam absorver o diagnóstico, a
pequena mão apertava cada vez mais forte, pequenas gotas de suor espalhavam-se nos
meus poros, o ar da sala parecia rarefeito e as paredes iam se aproximando como
seu de uma hora para a outra eu fosse entrar em um colapso.
-Teve
metástase e infelizmente o tumor é maligno, iremos fazer a cirurgia, mas o câncer
já está em um nível avançado e a cirurgia é arriscada, mesmo que seja retirada
parte dos órgãos que foram afetados provavelmente só será para ganharmos tempo.
Sinto muito Sr. Leandro.
Meu
corpo estava ali, imóvel e absoluto. Na volta para casa Bianca não disse nada
apenas chorava disfarçadamente enquanto dirigia, ela estava tentando ser forte
por nós dois. E geralmente ela era, mas não dessa vez.
Eu
estava em ascensão no meu trabalho, tinha a mulher que eu amava do meu lado, e
considerava-me feliz. Depois da notícia todas as minhas certezas tinham caído por
terra. Era para o mundo ter se tornado mais cinza, porém eu vi cores que nunca
tinha visto. Fiz coisas que jamais faria
e vivi meus sentimentos intensamente. Bianca era o bem mais precioso que eu
tinha, e aquele pequeno ser que crescia dentro dela era a minha continuação aqui
na terra, eu costumava dizer que era a minha sementinha implantada para
continuar a minha trajetória, sonhava com essa criança, fazia planos e agora não
sabia nem se veria seu nascimento, as incertezas eram as únicas respostas que
eu tinha.
Eu
brincava com o vento aquela tarde, enquanto ele esvoaçava em meu rosto eu
tentava escutá-lo, entender o que aquele pequeno barulho traduzia-se ao meu
ouvido. Parecia uma canção sem nenhum significado aparente. A cada dia que passava
era como uma vitória, um bônus do céu. A barriga de Bianca tornava-se cada vez
maior, a vida nascendo dentro dela, a nossa vida, e a minha morrendo dentro de
mim. A cirurgia tinha data, meu destino parecia estar marcado, mesmo com o
tratamento eu sabia que minhas chances eram mínimas, era tudo uma questão de
tempo. Eu sei que o destino do ser humano é a morte, a verdade é que ninguém nunca
está preparado para enfrenta - lá.
Ela
tinha a mesma covinha da mãe perto da boca quando sorria, os mesmo olhos
brilhantes, mas tinha a minha boca e o meu sorriso, era o que Bianca me disse.
Segurei nos meus braços aquele pequeno ser, o amor que eu já tinha pela pequena
Clarisse não continha-se no meu peito, costumava ficar horas com ela embalando
na cadeira de balanço e contando os planos que eu tinha para a nossa família, a
maneira como eu amava a mãe dela, e como eu sonhava com a chegada dela, eu
sabia que ela não entenderia então gravei um vídeo pois sabia que não levaria
ela no primeiro dia de aula, ou dançaria a valsa dela nos 15 anos ou implicaria
com seu primeiro namorado. E o meu coração apertava sempre que eu pensava em
partir e deixar elas duas para trás.
Eu
estava deitado ali naquela sala de cirurgia, meus olhos flertavam o teto,
tantas coisas passavam em minha mente, principalmente aquilo que eu não tinha
feito, as oportunidades que deixei para trás, o perdão que não tinha liberado
por mágoas antigas, as pessoas que eu já tinha machucado e feito chorar. Eu
tinha deixado tanta coisa passar e era tão tarde para reaver tudo isso.
Eu
não senti nada, eu não vi nada, só lembro o claro perto de mim e a imagem da
Bianca e da Clarisse, meus pais já falecidos, aquele céu colorido e a grama
fofa e verde que passava debaixo do meu corpo, o barulho daquele vento, foram as
imagens montadas em minhas mente naquele momento. Eu queria ter tido mais
tempo, queria ter dito sobre meu amor, queria ter falado mais coisas para a
Clarisse, deveria ter dado mais atenção para Bianca nos últimos anos, tanta
coisa eu falhei. E de repente veio imagens vagas e distorcidas a voz estava
ali, as lembranças ao qual eu tinha fortemente guardadas no meu subconsciente.
-Eu
sempre vou te amar.
Olhei
para os olhos dela, tão lindos, era como se eu conseguisse ver a alma dela
refletida neles. Eu a queria para sempre em meus braços, era desesperador saber
que eu teria que soltar de sua mão.
-Perdoe-me
por ter errado tanto com você, por não ter dito todos os dias o quanto você é
linda, por não ter comprado aquela casa que você tanto pediu, por já ter feito você
chorar. Eu queria ter mais tempo
com você, queria ter a minha vida inteira com você Bia.
Enquanto
eu soluçava ela só acariciava meu rosto enquanto quietava meu coração afligido.
-
Amor, você foi a melhor coisa que já aconteceu na minha vida, você foi perfeito
mesmo com tantos defeitos, porque você fez os meus sorrisos mais sinceros, me
deixou viva e com um motivo para nunca desistir.
A
voz dela se tornava fraca na minha mente, as imagens distorcidas, e o mundo
distante. Eu sempre tive curiosidade de saber como era a morte, e no fim percebi
que ela não é bonita, é assustadora porque vai te afastando das pessoas que
você ama, te faz fazer falar adeus mesmo querendo ficar, te traz dor. Ela
libertava aos poucos meu corpo doente, e de repente fazia tudo ficar fraco,
frio e longe. Eu sabia que um dia iria morrer, mas eu nunca estive preparado
para isso. Nunca estamos.
Juliana Santiago
Nossa... Gostei muito. Que tal escrever mais ? :) Só um texto que terá nesse ano de 2014 ? rs Sucesso, Rainha!
ResponderExcluirAtt, Marcelo.