segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Sombras da realidade


Ela era incrivelmente curiosa, questionadora e quase um papagaio em pessoa. Sempre observando aquela criatura instigante, o jeito que ele olhava as pessoas era diferente, não olhava corpo ou a roupa que a pessoa estava usando, ele utilizava metódos não convencionais para determinar aquilo ao qual achava importante, suas ferramentas preferidas eram o conhecimento e suas percepções do mundo, como se tudo se distinguisse no saber. Tão simples. Sem retalhos, inclinações ou formas pré-definidas de pessoas ideiais. Mas o que seriam pessoas ideais?
Ela estava impecável, andava pelos corredores, chamava atenção, talvez nas suas curvas, ou talvez nas roupas de marca, ou outros apretechos superficiais, porém não era isso que ela procurava, era a vizualização do que ela tinha a oferecer, por detrás daquilo tudo tinha um ser crítico e pensante pronto para sair do casulo. Seus passos lentos se apresseram ao passar ao lado dela, seu olhar minuncioso recobriu o rosto dela, mas dessa vez olhou profundamente em seus olhos, era como se ele pudesse ler todo o seu ser, e seus mais profundos mistérios tão facilmente.
Ela já tinha visto ele conversando com algumas pessoas, exteriorizando tudo aquilo que passava sobre sua cabeça viajante. Um dia então, a coragem serviu-a como em um banquete, e prontamente ela aproveita a oportunidade.
-Oi. - ela fala ainda tímida, enquanto ele levanta a cabeça do seu desenho, ao qual de começo eram apenas riscos abstratos e sem sentido algum.
-Olá. – Ele fala sem fleuma.
-Posso me juntar a você? – ela pergunta envergonhada.
-Claro. – seus olhos rápidos e cautelosos voltam para seus riscos grossos.
O silêncio se faz presente por algum tempo.
-Qual seu nome?
-Pablo e o seu?
-Nossa! Igual o Pablo Picasso, agora entendi de onde veio seu dom. – Ela fala com uma risada eufórica.
Um sorriso escapa dos lábios dele. Ela se sente mais a vontade por ter quebrado o gelo.
- Júlia. Júia Sophia.
-Que lindo nome, qual a história?
-Engraçado, ninguem nunca tem curiosidade sobre a história do nome de alguém, mas é minha mãe que sempre quis colocar o nome da filha dela assim, Júlia derivado do nome dela e Sophia que diz sabedoria.
-Interessante. Interessante – Ele fala distante como se tivesse meditando em algo.
- O que você está desenhando? – Ela pergunta curiosa.
- O título desse desenho é a sombra da realidade.
-Ham? – Ela exprime sem entender nada.
-Vou tentar explicar o que vejo, para que você entanda com meu olhar.
-Certo.
-A nossa realidade se cruza com uma infinidade de variáveis. Variavéis essas que nós mesmos estabelecemos, ou a vida estabelce. Destinos não existem, o que acontece é o resultado daquilo que decidimos. Está vendo esse embaralhado de traços pretos? São as sombras que recobrem cada um de nós, tais sombras que se fazem presentes na nossas vidas e posteiores resultados.
-Nossa que interessante.
- Ou seja, você é fruto das suas sombras, cabe a você transformar em luz.
O sino toca repentinamente, a conversa leva Sophia para um mundo surreal, ao qual ela tentava desvendar tais palavras, a possível realidade ao qual ela acabara de ouvir, em um âmbito louco de fazer parte daquilo. Os dias passaram, as conversas ficaram cada dia mais intensas, e proveitosas, a maneira dela pensar e encarar o mundo mudou. Talvez porque ele olhava justamente onde ela queria, no seu sorriso e seu olhar. Era diferente, era único. Ela aprendera que nossa realidade é um conjunto de sombras, tais sombras essas que podem ser luz, ou trevas dependendo daquilo que cada um toma para si. Todos os dias, e em todos os momentos. Estranho mesmo é a forma à qual ela enxergava o mundo. E a forma que mesmo de jeitos tão diferentes se completavam, como um quebra cabeça irregular que no fim cada pedaço se molda perfeitamente, peça a peça, encaixe a encaixe.


Juliana Santiago